Ou escrevo e então delato (me)? Ou apago e deleito (me)? Ou assino e delito (me)? Ou ignoro tudo e deleto (me)?
Não. Escrever é produzir epílogos do não iniciado. Sumarizar o diáfano. Documentar o não-acontecido. Testemunhar em falso. Dar (in)versões do impalpável. Melhor não. Definitivamente Não.
(foto: Thanatos artificialis, de Daniel Martins)
Epílogo
De um certo modo, a Sra. C. agradeceu quando a cena foi-lhe entregue inteira no monitor do vídeo de segurança. Ele esgueirou-se. Olhou em volta. Avançou através do corredor. Era meio-dia de um dia cheio de luzes. (Luzes são presentes, quando se retira a opção da treva). Alguns passos, o suor a grudar os cabelos no pescoço. Taquicardia. Olhou novamente em volta. De propósito, desconsiderou a câmera no corredor. Essa a glória dos crimes (im)perfeitos, precisam ser desvelados. Clamam para que se lhes arranquem das sombras, que se lhes exponha no cerne a cretinice ou a inteligência dos mandantes. A execução bizarra que deixa pontas. Na ponta do fio que leva ao minotauro, a obviedade de Teseu. No corredor, as dobras do tapete puido erguidas, a umidade dos tempos escuros a escorrer das paredes do hotel de quinta. Decrepitude. Ausência. Senescência programada. Apoptose. No último ato, as mãos ansiosas dele colocaram sob a porta o bilhete amarfanhado. Dava contas do passado e ria. E ria. E ria.
Tendo encontrado o desfecho necessário para concluir O Livro das Solidões Infelizes, a Sra. C. fechou-lhe as páginas e cerrou as pálpebras. Logo, a última gaveta receberia – para jamais ser editado – o seu penúltimo mau romance.
19 comentários:
Talvez a senhora C. seja dura demais consigo mesma...
Nossa! , que mágico o encontro das palavras que envolvem seus textos e poemas...d+,adorei..Abrçs
jefferson p.
C escreveu!? Viva!!! C sabe, desenrolar as linhas do novelo da vida, e, fazê-las virarem bons escritos. Acho que, estou de acordo com o 1º comentário. Some, não, viu? AbraçoDasGerais.
E.T.: bom feriado.
Há dias passo por aqui, mas a Lua parece não querer fazer tânsito em Libra. Então espero... eis que o arcano de hoje traz uma carta enigmática, mas não quero decifrá-la. Deixo que a própria vida desvende seus mistérios, minha Lia, assim como devemos permitir que a escrita nos mostre o deleite, o delito e/ou o esquecimento...
Difícil é esquecer os silêncios.
Beijo na tua alma.
Entre labirintos de corredor, câmeras de vigilância, crimes imperfeitos e clima kafkiano, a Sra C parece ter algo a dizer. A gaveta, decididamente, não é seu melhor destino. Ah (aluno de ensino médio), concordo com as palavras do Diovvani.
Abraço, querida!
P. S.: Ok, vou publicar o Sagaz e Destemido.
Cecilia, escrevi mais um pouco sobre aquele assunto lá no blog. Acho que a situação chegou num ponto tal, no Brasil, que está na hora de buscar soluções de fato, e não apenas dar vazão à nossa raiva. Quanto aos direitos humanos, pobres deles: nunca tiveram uma chance de ver a luz no nosso país. Se tivessem sido aplicados alguma vez, talvez não tivéssemos chegado a um nível tão desesperador. Acho que é hora de começar a aplicar os direitos humanos, pelo menos para experimentar. Pode ser que dê certo.
Amo teu ritmo. Dá vontade de ler em voz alta. beijo
Oi, Moça.
Seu blog (explorei toda a primeira página dele) fica entre a irrealidade mais surrealista do impressionantemente belo e a locução impronunciável que sabe à perfeição.
Excelente, Cecília.
Gostei de tudo e quisera levar muita coisa daqui, mas por enquanto me contento com duas ou três linhas do seu (excelente) eopilogo.
Se você não concordar, por favor, diga-me, para que eu retire da minha página. OK?
Doces pra você.
Vicente
Oi, Cecília.
Deu vontade de comentar sobre o seu texto "Ocos".
Não consegui. Copiei apenas o quisera ter escrito, talvez de mim mesmo: "Sou só o oco queimado querendo ficar lá, no fundo, em silêncio..."
Dulcíssimos abraços.
Vicente
Oi, Cecília.
Adorei seu perfil.
Posso ter a mesma idade que a sua?
Aguardo sua resposta.
Pra você eu deixo doces (de, no máximo uns 152 anos, tá?)
Vicente
Cecile: embatuquei! não sei o que dizer, não sei o que achei, não sei se entendi ou se não entendi... aproveito a oportunidade para ficar em reverencial silêncio.
A vida, quando a gente cutuca, grandes histórias pulam para fora.
hábeijos
ecoou o silêncio
e as palavras, vivas
no peito, Sra. C.
no peito
ardem em poesia.
bjos.
Adorei, Cecília! Mas se quiser saber, escreva sim, viu? Me deixou saudades... Beijos ;)
Cecília. Comecei a conhecê-la, através do poema sobre foto...
Hoje li o texto em prosa e concluí que seu jeito direto, destacando idéias, com um discurso indireto livre...é fascinante, também.
Coloquei seu endereço no meu blog, ou, melhor dizendo, "linkei-a"...
Tudo bem?
Um grande abraço
Dora
Oi cecilia, nossa muito bom o seu escrito!nossa muito bom, mesmo!!!!beijinho e ate breve!!!!
Vamos abrir as gavetas, lançar um pouco de luz na treva infinita que esconde palavras tão fartas. Vamos!
Essas suas palavras e minha cabeça como propagadora dos seus ecos...
Beijos, menina.
adorei este Epílogo,
passe lá no cemitério depois.
beijo
tem continuação lá.
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