quarta-feira, outubro 18, 2006

Dia do Médico

- Vai doer?, ela interrompe a explicação sobre o procedimento que precisávamos fazer para tratar suas muitas verrugas nas mãos.

Olhando nos olhos: - Vai. Um pouco, tento suavizar.

- Mas vai doer quanto, como se arrancassem minha mão?

Pensei por um instante nos trilhares de cristais de gelo pontiagudos do nitrogênio, espetando os pequenos dedos. - Como se tivessem cem formiguinhas...

Os olhos azuis e límpidos me olharam em silêncio. Decidi prosseguir: - Maaassss ! Se colocarmos este remédio mágico ! Maaassss ! Se a mãe te levar para tomar um suco ! Maaasss ! Se a gente contar meia hora no relógio, quando voltarem aqui serão só cinqüenta.

- Cinqüenta?

- É, das menos ferozes. Coloquei o anestésico e observei a graça da menina em sua jardineira de cintura franzida afastando-se com a mãe.

Meia hora e uns minutos depois, o procedimento concluído, os olhos vermelhos, as faces afogueadas, o nariz fungando as lágrimas que ela tentava orgulhosamente esconder:

- Doutora - levantei os olhos do papel onde escrevia as orientações - quando a gente faz o que precisa, né que as formigas criam asas e voam, que nem borboletas?

(para a Srta. R, que nos seus sete anos me lembrou, hoje, que é branca a minha melhor roupa)

foto: Ana Maria Rosso

12 comentários:

Anônimo disse...

lindo, de chorar e de sorrir. quando eu ficar doente, quero ser tratado por você - ou por um(a) médico(a) como você. parabéns, doutora.

Anônimo disse...

a relação q tenho com medicos é de muito respeito!! acho lindo a dedicação!!! de verdade... e o seu texto de uma beleza impar...nesse dia o q nos resta é pedir pro papai do ceu que de condições p/ q esses profissionais possam clinicar com dignmidade nesse pais...
beijao e ate mais...

Dalva M. Ferreira disse...

Que levinho!

CarolBorne disse...

Ah, as crianças!!!

Anônimo disse...

lindo, muito lindo, adorei.

Anônimo disse...

postei você lá! vá ver!
beijo

dade amorim disse...

Linda homenagem, Cecília. Um beijo.

Anônimo disse...

e quem escreve assim e sente assim, a roupa melhor que veste é a da alma que tem olhos para perceber.
A Val me trouxe e usei teus versos para comentar lá.
Carinhos

marcia cardeal disse...

e você ainda abre essa leveza com margaridas!!!beijos

douglas D. disse...

eu estava hoje, em sala de aula, discutindo phillipe meyer, mais precisamente qdo este defende que a medicina precisa, visceralmente, visar não apenas o seu desenvolvimento mas, primordialmente, a felicidade do ser humano, e eis que venho aqui e descubro seres médica e teres a sensibilidade que tanto falta àqueles que entendem a medicina qual um balcão altamente qualificado e o paciente, tão somente um objeto a ser enquadrado à luz do CID...
confesso que a felicidade invadiu-me!!
bjos.

Anônimo disse...

Bonjour ma très chère Cecilia,

Lendo esse lindo relato me orgulho de ser também tua paciente. Além de amar o
teu "ofício", tens por teus pacientes uma imensa ternura sem deixar de exercer
como se deve essa dura profissão que é do médico.

Un gros bisou
Jacqueline

Edilson Pantoja disse...

Ah, essas crianças! Nesses dias, a Lia, três anos, que tem um tartaruga de pelúcia chamada Poc, me disse quando a surpreendi conversando com Poc: "Papai, o Poc tá vivo!"
Abraço, querida, e parabéns, ainda que atrasado!